Em algumas ocasiões a Grace, que tem a sensibilidade que me falta nestas coisas, separava ou providenciava algumas lembranças para o "amigo da igreja". Na páscoa ou no aniversário de Rafael, um chocolate ou um pedaço de bolo de aniversário, sempre lembrava de enviar algo para ele - e claro, me cobrava a entrega. Rafael adora dar presentes e fica sempre contente quando o faz.
Nestes dias natalinos foi ela de novo fazer mais um carinho: uma lembrança de natal. Ao recebê-lo dessa vez, o "amigo da igreja" logo perguntou: -"Ele vai passar aqui amanhã? Eu quero dar um presente pra ele!". Tranquilizei-o que passaríamos no dia seguinte.
Naquele dia, ao passarmos pela igreja e saudarmo-nos, o "amigo da igreja" disse que havia esquecido o presente mas que traria no dia seguinte. Rafael já não estaria mais em aulas mas disse a ela que passaria por lá como sempre, agora para ir ao trabalho.
Dia seguinte e ao passar pela igreja o "amigo da igreja" pergunta pelo Rafael com o presente na mão com uma indisfaçável frustração ao não vê-lo. Recebi o presente agradecido dando a garantia de repassá-lo ao meu filhinho.
O carinho que já sabia premeditado, foi produzindo aquela dorzinha boa no coração que lembra-nos que nestes momentos é que estamos realmente vivendo o intenso - mas tão reprimido - sentimento da vida, de estar vivendo realmente.
Durante o dia, a raiva que me impulsiona na pequena sobrevivência deu lugar aquela leveza que arrogantemente te coloca num nirvana de compreensão de valores na vida. Nas pessoas que queria bater, beije-as levemente como se quisesse repassar esse sim: presente.
E ao passar no dia seguinte pelo "amigo da igreja" ele veio até mim e perguntou: "- Ele gostou?". Minha resposta - não sei se ele entendeu sua amplitude - era mais um agradecimento meu do que pelo carinho com o Rafael:
"-Sim, muito obrigado. NÓS gostamos. Gostamos muito."